O livro de ECLESIÁSTICO testemunha uma época de transição onde já se começam a esboçar os traços característicos do judaísmo como forma evoluída de religião bíblica. Trata-se de um judaísmo poliforme, onde o próprio cristianismo viria lançar raízes. Mas é diferente da tendência rabínica posterior, a que o ramo preponderante do farisaísmo, especialmente a partir de 70 da nossa era, viria dar um aspecto monolítico.
Do confronto helenismo-judaísmo, ECLESIÁSTICO assimila o que considera bom e compatível com a sua fé; mas rejeita o que se opõe à essência da fé judaica e alerta para os perigos da cultura envolvente e dominante. A respeito do Cânon das Escrituras, o Prólogo menciona já a divisão tripartida "Lei, Profetas e os outros livros" (ver 39,1-3), e o próprio livro cita ou menciona mais ou menos diretamente muitos desses livros sagrados.
O autor faz ainda uma síntese da religião tradicional e da sabedoria comum, à luz da sua própria experiência. O tradutor grego quis tornar este manual de conduta acessível a todos aqueles "que, em terra estrangeira, querem instruir-se, reformar os seus costumes e viver segundo a Lei" (Prólogo). A identificação entre a sabedoria e a Lei de Deus (24,23) é a afirmação mais inovadora e característica de ECLESIÁSTICO, tal como é inovadora a inserção da História no gênero sapiencial.
A série de personagens da História de Israel, cujo relato se apresenta na parte final do livro (44,1-50,21), tem o objetivo pedagógico de despertar o orgulho em pertencer a um povo de grandes homens. Porque eles seguiram a palavra de Deus com toda a fé e coragem e foram bem sucedidos, são uma lição para o povo e serão sempre lembrados na posteridade.
ECLESIÁSTICO defende a fé tradicional do seu povo: Deus é eterno e único (18,1; 36,4; 42,21), é autor de uma criação perfeita, apesar dos seus mistérios e contradições aparentes (42,21.24); e, diante dela, o próprio Eclesiástico, como o salmista, enche-se de um especial entusiasmo (39,12-35; 42,15-43,33). Deus tudo conhece (42,15-25); "Ele é tudo" (43,27), governa o universo com justiça e prudência (16,17-23) e retribui com equidade (33,13); é misericordioso, capaz de perdoar e de salvar no tempo da aflição (2,11); é Pai, não apenas de Israel, de quem é o Deus único (17,17-18; 24,12), mas também de cada indivíduo (23,1). Esta concepção constitui um progresso considerável na teologia do judaísmo.
continua amanhã........
Nenhum comentário:
Postar um comentário